Thursday, December 30, 2010

Bad Science e Feliz 2011


No final de cada ano é costume fazerem-se balanços do ano que passou. Eu, por exemplo, costumava fazer um balanço dos filmes estreados. Este ano, contudo, não vou fazer balanços, mas vou simplesmente falar de um livro que li em 2010 (embora ele tenha sido lançado antes) e de que gostei muito. É um livro de divulgação científica chamado Bad Science (em português, Ciência da Treta), e é de Ben Goldacre.

Goldacre é um médico que se dedica em parte a chamar a atenção para as tangas das medicinas alternativas, de (alguns) nutricionistas, e até para os escândalos dentro da própria medicina. É um céptico exemplar e um comunicador extraordinário, escrevendo com uma linguagem simples, clara e divertida, mas, simultaneamente, explica as questões a fundo.

A sua abordagem nunca é simplista; por exemplo, dedica alguns capítulos a escândalos que ocorreram na medicina, mas depois dedica outros a explicar algo que raramente vejo esclarecido, e que é um erro que muitas pessoas cometem: não é por ter havido um escândalo no passado, que agora tudo o que a medicina produz é mau. Esta linha de raciocínio é até bastante perigosa, mas bastante comum. É um pouco como pensam os ursos polares do cartoon acima...

Trata-se, portanto, de um livro cuja leitura recomendo a todos.

Costuma-se também, no final de cada ano, pedir desejos para o ano seguinte. Para 2011, ocorrem-me dois: que The Tree of Life, de Terrence Malick, seja um filme extraordinário; e que Manuel Alegre não seja Presidente da República. Felizmente, a probabilidade de ambos se tornarem realidade é muito grande!

Feliz 2011!

Thursday, December 23, 2010

Para que serve a exploração espacial?


Porque vamos explorar o espaço se há pessoas a morrer à fome na Terra?

Esta pergunta é de vez em quando colocada por variadas pessoas (por exemplo, por Saramago), embora não faça qualquer sentido. Há muito dinheiro mal gasto na Terra (em guerras, por exemplo), porque não perguntar antes se o vamos continuar a gastar quando há pessoas a morrer à fome? E na Terra também se faz investigação científica, não é só no espaço; como tal, para quem coloca a questão acima, porque não usa também toda a investigação científica sem aplicabilidade imediata para o seu argumento?

A resposta parece-me evidente: para fazer uma metáfora mais bonitinha. Ao opor-se desta forma o que está longe e o que está perto, e dizendo que se chega mais facilmente ao primeiro, talvez se ache que se está a usar uma poderosa metáfora. Infelizmente, quem o faz não se apercebe de que ao colocar a questão assim, preto no branco, separando desta forma redutora os supostos problemas importantes (os que estão perto) dos supostos problemas irrelevantes (os que estão longe), só está a ser absolutamente demagógico e simplista.

Para quê, então, explorar o espaço? Na minha opinião, há uma razão que se sobrepõe a todas as outras: pelo conhecimento. Pela mesma razão que criámos a História ou a Ciência, pela vontade de conhecer, seja o passado ou o mundo que nos rodeia. Não faz sentido que essa busca pelo conhecimento deva ter critérios diferentes se for feita na Terra ou fora dela, a não ser na cabeça de quem se usa da exploração espacial para fazer expor os seus argumentos de forma demagógica.

Felizmente, há ainda outras razões para fazer investigação em espaço, incluindo imensas aplicações úteis no imediato para a sociedade. Para dar a conhecer essas aplicações ao público, a NASA editou um documento (pode ser lido aqui) onde explica como tecnologias utilizadas para exploração espacial acabaram por ter aplicações em diversas áreas, desde a medicina até aos transportes.

Não se deve, no entanto, cair no erro de achar que toda a investigação que se faz deve ter aplicabilidade imediata. A maioria da investigação faz-se para aumentar o saber. Só depois de se conhecer é possível entender que benefícios poderá trazer.

Saturday, December 18, 2010

AfterEffects? Não, física!


No dia 1 de Julho de 1940, foi inaugurada uma ponte nos EUA chamada Tacoma Bridge, que viria a durar apenas 4 meses. De facto, no dia 7 de Novembro de 1940, um vento costante de menos de 70 km/h fez a ponte oscilar de tal forma que esta acabou por colapsar. Mas como pode uma ponte colapsar com um vento constante não muito forte? A história torna-se ainda mais estranha quando se vê o video abaixo.

Ao contrário do que afirmam alguns comentadores do youtube, este video não é falso. Mas, voltando à questão anterior, como pode um vento de menos de 70 km/h provocar estas oscilações?

Para termos uma ideia do que se pode estar a passar é possível fazer uma experiência relativamente simples, com uma mola mais um peso na ponta. Experimente-se fazer a mola oscilar devagar, para cima e para baixo. O resultado é evidente: a mola vai oscilar devagar. Experimente-se agora aumentar, a pouco e pouco, a frequência dos impulsos que estão a provocar a oscilação. O resultado continua a ser intuitivo: as oscilações da mola vão ser cada vez maiores.

No entanto, se continuarmos a aumentar a frequência com que fazemos a mola oscilar, é possível que cheguemos a um resultado de alguma forma surpreendente: as oscilações da mola vão começar a diminuir. De facto, as oscilações da mola não aumentam sempre que aumentamos a frequência dos nossos impulsos. Na verdade, vai haver uma certa frequência para a qual as a amplitude das oscilações da mola é máxima. Essa frequência tem um nome especial: é a frequência natural da mola.

Voltando à ponte, foi precisamente isso que aqui aconteceu. Os engenheiros que projectaram a ponte esqueceram-se que ventos comuns poderiam colocá-la a oscilar precisamente na sua frequência natural, aquela que corresponde à amplitude máxima das oscilações. O resultado foi o que se viu.

Ao contrário do que muita gente pensa, não é o Adobe AfterEffects que desvenda os segredos deste video. É a física.

Thursday, December 16, 2010

tree of life


Tree of Life is a period piece centered around three boys in the 1950s. The eldest son (Hunter McCracken none SAG) of two characters (Brad Pitt and Jessica Chastain) witnesses the loss of innocence.

We trace the evolution of an eleven-year-old boy in the Midwest, Jack, one of three brothers. At first all seems marvelous to the child. He sees as his mother does, with the eyes of his soul. She represents the way of love and mercy, where the father tries to teach his son the world's way, of putting oneself first. Each parent contends for his allegiance, and Jack must reconcile their claims. The picture darkens as he has his first glimpses of sickness, suffering and death. The world, once a thing of glory, becomes a labyrinth.

Framing this story is that of adult Jack, a lost soul in a modern world, seeking to discover amid the changing scenes of time that which does not change: the eternal scheme of which we are a part. When he sees all that has gone into our world's preparation, each thing appears a miracle precious, incomparable. Jack, with his new understanding, is able to forgive his father and take his first steps on the path of life.

The story ends in hope, acknowledging the beauty and joy in all things, in the everyday and above all in the family -- our first school -- the only place that most of us learn the truth about the world and ourselves, or discover life's single most important lesson, of unselfish love.

Esta é a sinopse, já há algum tempo divulgada, do próximo filme do sublime cineasta Terrence Malick, The Tree of Life. Desde a sua divulgação, mais nada se soube do filme, à excepção dos sucessivos rumores sobre datas de estreias sucessivas que acabavam por não se verificar, o que já é costume nos filmes de Malick, por dificuldades com as distribuidoras e pelo longo tempo que Malick costuma dispender a montar os filmes.

Com as expectativas em alta, saiu agora finalmente o trailer de The Tree of Life. O que vi não me podia ter deixado mais satisfeito. O típico estilo Malickiano está lá, na contemplação das imagens, na reflexão em voz-off, na relação do Homem com a Natureza e na perfeição dos planos. No entanto, há algo mais aqui, que não existia nos anteriores filmes do realizador, nem mesmo em The Thin Red Line: um tom épico poderosíssimo e incrivelmente ambicioso, estilo 2001: Odisseia no Espaço, como se se quisesse fazer o maior filme de todos os tempos.

Na maioria dos realizadores, este tom seria certamente ridículo. De Malick, espera-se o melhor. Aqui fica o trailer.


Wednesday, December 8, 2010

a audácia do sonho


No curso de Verão que frequentei em Kiruna este ano, intitulado Human Spaceflight and Exploration, o antigo astronauta alemão Gerhard Thiele deu uma primeira palestra sem qualquer apresentação de slides como suporte. Simplesmente colocou questões relacionadas com espaço, e incentivou a discussão de opiniões à medida que também ia partilhando as suas.
Porque é que exploramos (em particular o espaço)?


O que significa exactamente explorar?


Qual é a diferença entre explorar e fazer ciência?
Lembrei-me desta palestra e das questões que foram levantadas (assim como de algumas das respostas de colegas meus) ao ler o livro As Ligações Cósmicas, de Carl Sagan, quando ele fala na mensagem enviada para o espaço a bordo da Pioneer 10 em 1972 e da Pioneer 11 no ano seguinte.

Nestas naves espaciais foi colocada a placa que está na figura. A mensagem, que gerou muita discussão e crítica, destina-se a uma civilização extraterrestre que possa um dia interceptar uma das naves. Algumas das críticas eram pertinente: conseguiria uma civilização extraterrestre interpretar alguma coisa do que lá está? No entanto, outras eram simplesmente estúpidas, sobretudo as vindas de grupos feministas que conseguem sempre arranjar forma de inventar que a mulher está representada como um ser inferior ao homem.

A mim, no entanto, pouco me interessa discutir a mensagem que lá está. Parece-me pouco provavel que, na eventualidade de ser interceptada, a mensagem seja entendida, mas não creio que seja isso que importe. Concordo com quem na altura escreveu que "teremos todos morrido quando esta mesma mensagem numa garrafa for recebida por uma indiscritível patrulha espacial". De qualquer modo, o fundamental é "a sua existência, a audácia do sonho".

No limite, talvez seja a isto que se resume a nossa vontade de explorar. A nossa capacidade de ver mais longe, para lá do tempo que dura uma vida humana, mantendo a esperança na intercepção daquela mensagem que assinala que estamos aqui, independentemente de sermos ou não compreendidos, e sem nunca sabermos que alguém sabe que existimos.

Friday, December 3, 2010

Vida "extraterrestre" na Terra


Há alguns dias, a NASA anunciou que iria fazer um comunicado sobre uma descoberta que teria enorme impacto na procura de vida extraterrestre. O mau jornalismo, que também chegou a jornais de portugueses de qualidade, anunciou com pompa que a NASA poderia ter descoberto vida extraterrestre. Na altura cheguei a dizer (não aqui no blog) que o que tem impacto para a ciência poderia ser insignificante para o público em geral, e que possivelmente seria isso a acontecer.

E assim foi. O anúncio da NASA teve que ver com a descoberta de uma bactéria (não noutro planeta, mas aqui na Terra) que pode utilizar arsénico para sobreviver. Isto, como é evidente, nada diz ao senso comum. No entanto, é importantíssimo para a ciência, pois até agora não se conhecia nenhum organismo vivo que pudesse utilizar arsénico, um elemento tóxico, para sobreviver. Descobriu-se, portanto, um ser vivo com capacidades completamente diferentes de qualquer outro anteriormente conhecido.

E o que tem isto a ver com vida extraterrestre? A resposta está relacionada com o seguinte: quando procuramos vida extraterrestre, o que é que devemos exactamente procurar? Seres iguais aos que encontramos na Terra? Seres diferentes destes, mas que continuam a utilizar os elementos que associamos à vida - carbono, fósforo, oxigénio, etc.? Ou será que a vida na Terra baseia-se nesses elementos por serem mais comuns, e que os seres vivos de outro planeta poderiam necessitar de elementos para sobreviver que nós consideramos tóxicos?

Alguns cientistas pensam que a vida teria de surgir associada aos mesmos elementos que surge aqui na Terra - é ao que Carl Sagan chama, no livro As Ligações Cósmicas, o "chauvinismo do carbono". No entanto, acabou de se provar o contrário. Como consequência, as formas de vida existentes pelo Universo podem ser completamente diferentes das que conhecemos, o que aumenta a probabilidade de se descobrir vida.

No blog astroPT, Carlos Oliveira dá o seguinte exemplo, no nosso próprio Sistema Solar: "em Titã [lua de Saturno], existe o ambiente “ideal” para bactérias como estas… e não para o tipo de vida que andávamos lá à procura!"

Afinal, acabámos mesmo de descobrir vida "extraterrestre"... mas na própria Terra.